sábado, 23 de fevereiro de 2013

Ateus, crentes e agnósticos .

Ateus, crentes e agnósticos .

Escrevi "tempos atrás" , em um debate via internet, algo sobre o agnosticismo e sobre teísmo, que gostaria de compartilhar com vocês agora:

A ideia de um "ente" superior não faz o menor sentido para o ateísmo, em nenhum dos possíveis conceitos de divindade:
1- deus como criador do mundo , o deus do monoteísmo (deus da tradição judaica-cristã-islâmica).
2- deus como "ente superior", mais forte que nós, e eterno, mas, que não criou o mundo (deuses egípcios, gregos, africanos, mesopotâmicos, nórdicos ...).
3- deus como o próprio universo (panteísmo).

Ser ateu, não é apenas não acreditar em um deus, envolve mesmo uma questão Ética, é um posicionamento ético-filosófico. Mesmo que exista algum "ente mais forte que o humano", do ponto de vista intelectual e com uma capacidade de transformação da realidade (um alienígena de alguma civilização mais avançada tecnologicamente, por exemplo), render-se a esse "ente", prestar cultos a ele, ajoelhar-se diante dele, seria algo indigno; aliás, mesmo se tal criatura realmente existisse, seria sem dúvida apenas mais um "ente" da natureza, assim como nós e as demais espécies e coisas do mundo.

-O ateísmo racional, também, desconstrói o "conceito" de divindade proveniente da tradição judaico cristã, que é completamente ingênuo.
A ideia de um ente criador do universo não faz sentido algum e não há muita dificuldade em demonstrar isso com uma simples argumentação lógica (deus cria o universo: como pode criar algo do nada? Se "um deus" criou algo do nada, então, tudo é possível; fadas seriam possíveis, ogros, unicórnios, qualquer outro "deus" seria possível e já não poderíamos mais debater sobre nada com um mínimo de racionalidade, sendo que o próprio argumento (na verdade nem dá para considerar argumento isso) acaba por se autodestruir, pois, não serve para sustentar a noção de um “deus criador” , já que abre para a possibilidade de que outros deuses, também, possam existir, nesse jogo do "tudo pode", é algo implícito nesse posicionamento ; Se algo pudesse surgir do nada, então, não seria mais possível pensar coisa alguma, pois, isso é um absurdo para o pensamento racional “coisa alguma pode surgir do nada”, nem mesmo podemos pensar o "nada" (aquilo que não existe de forma alguma). Claro que isso, então, nos coloca a seguinte questão clássica: "o universo sempre existiu?" Essa questão é insolúvel, uma antinomia da razão, diria Kant. Mas, veja, que isso não ajuda em nada o posicionamento teísta já que , na hipótese de um criador, surge novamente a mesma pergunta: "E o criador sempre existiu? Surgiu de onde esse criador?"; Se você aceita que deus sempre existiu por que não aceitar que o universo sempre existiu? Pesando outros argumentos, acho muito mais racional aceitar a ideia de que o universo sempre existiu e que é um absurdo falarmos em criação, mesmo um “big bang” pressuporia a existência de matéria-energia antes da explosão , matéria e energia que se condensaram no espaço, e que já existiam antes da própria explosão, sendo a explosão um momento de transformação do Universo (sendo o Universo a totalidade, incluindo tudo que existe e poderá existir; mesmo a ideia de "multiversos" estaria incluída nessa totalidade) e que poderia voltar a acontecer futuramente (ou não, ainda não sabemos); talvez o universo se expanda e se contraia de tempos em tempos como pensavam Heráclito e Empédocles, ou, talvez, não, mas, a noção de "algo surgir do nada" ou "um deus criar o universo do nada" definitivamente não fazem muito sentido.

-Se deus é perfeito e completo, por que criar um universo imperfeito ? Pois, se deus criou um Universo do nada e no Universo há o mal, morte, crueldade, dor, imperfeição, obviamente ele criou o mal, não há como escapar dessa, apenas um religioso delirante para não aceitar essa obviedade. Usam o apelo ao “livre arbítrio”, que, também, não faz nenhum sentido e não resolve em nada o problema:  se deus criou o universo e a possibilidade de livre arbítrio, então, já estava prevendo o mal no Universo que ele mesmo criou e ainda : se criou algo do nada e nesse algo (o Universo) há maldade, e antes não havia nada, é porque o mal já estava em "deus", o criador é o culpado. Agora se você diz “ o mal é ausência de deus” pressuporia então que o "mal" é uma força existente onde "deus" não existe ou não está, caso contrário o mal, então, é negativo e um simples nada, portanto não existe. Se o mal é uma força, então, competiria com o poder de deus e isso seria uma oposição a ideia cristã de divindade ,pois, o deus judaico-cristão é a força criadora absoluta e não compete (segunda a crença e a tradição) com mais nenhuma força criadora ou oposta a sua...

- Se deus é completo e absoluto, o Universo já deveria estar nesse deus, ele seria o próprio universo( sendo universo tudo aquilo que existe , existiu e poderá existir ) e, logo, até uma pedra e uma bactéria seriam deus , assim essa ideia de divindade perde todo o sentido.

-No momento que você acredita na possibilidade de existência de algo como um "deus criador", então teria que aceitar a possibilidade da existência de algo como  o "Grande Senhor Gnomo Dourado", aquele que estava "antes do antes do antes", antes mesmo de se cogitar o "antes" , aquele que vive sentado em seu cogumelo fosforescente...Como provar, segundo os termos da crença, que tal divindade não existe ou que a divindade "x" ou "y" é mais razoável que uma outra que acreditas ser mais "fantasiosa"?!!

- A História, também, pode destruir as bases das religiões, quando demonstra a gênese dessas doutrinas com fatos e provas concretas de fraudes e plágios que passaram de uma religião para outra no decorrer dos séculos e se você , ao conhecer a história de uma religião como o cristianismo, por exemplo, descobre ser essa uma fraude( é uma hipótese), logo a ideia que você tem de deus "vai para o brejo" se você tem como referência essa doutrina ( na real um conjunto de seitas que disputam interpretações sobre um livro compilado por um imperador romano interessado em se manter no poder, etc), pois,acreditaria em um deus inventado que você só conhece através de uma história inventada de um livro inventado. Se você for alguém honesto, intelectualmente, e interessado na “verdade” terá que rever sua crença ou, no mínimo ficará envergonhado de manter tal crença.

-Há um universo-natureza e somos partes dele (manifestações conscientes da natureza), seres racionais capazes de pensar esse mundo e transformá-lo dentro de nossos limites( que são muitos), e isso é o que temos; Se houver algum outro ente pensante em alguma parte do cosmos, é, também, manifestação da natureza e nada mais, ajoelhar-se a esse ente ( um "alien", por exemplo, como já me referi acima...) seria algo vergonhoso para entes pensantes como nós, seria como ajoelhar-se diante de um rei ou tirano... Desse ponto de vista ( na minha humilde opinião), dados os apontamentos referidos acima, o Agnosticismo é uma posição totalmente irrelevante, é a crença que não se assume por vergonha ou discrição . Ou você acredita e tenta argumentar ou não acredita e combate...Mas, não acreditar é muito mais difícil, vamos ser realistas...é quase um estigma que recai sobre a pessoa : “ seu ateu!” . Em um mundo onde prevalece a “ditadura” teísta, onde todas as demais religiões e formas de ver a realidade são oprimidas pelo monoteísmo de origem judaico-cristã-islâmica, ser ateu é quase um atentado contra a moral dos crentes, cegos e “donos da verdade”.

- Alguém diz “ a física não existe”, a “filosofia é falsa”, etc. O físico, o filósofo, não vão se revoltar ou sair matando os “descrentes” ou persegui-los ou queimá-los na fogueira (a não ser que o indivíduo tenha algum problema ...)...mas, ouse dizer que o deus (Papai Noel dos adultos) não existe e verá o que acontece, há imagens de Jesus nas escolas públicas, parlamentos, frases glorificando deus em notas de real...sorte a nossa que hoje os cristãos são mais mansinhos, se fosse na idade média seria churrasquinho na certa. Hoje , você pode perder o emprego, ser processado ou ser ridicularizado, difamado, etc (claro que isso acontece mais em países atrasados e toscos como o Brasil) ... e nos países islâmicos ( na maioria dos...) então, ouse questionar Alá, quem tem coragem para arriscar o pescoço?...

-Bom, ainda há uma outra possibilidade de manter a ideia de deus viva: dizendo que ele criou a razão humana e pode manipular nosso pensamento como quiser, mas, se fizesse isso seria um deus "mal" não apenas "mau", logo, imperfeito (Descartes, toca nesse argumento em suas meditações..). Descartes, também tenta sustentar a ideia de deus com base na noção que temos sobre tudo que há ou está “além de nós”, perfeito, infinito. Nós, como entes mortais, que não podemos gerar a nós mesmos, somos finitos, como podemos ter a ideia de algo infinito e eterno? Ora isso se resolve com a ontologia pré-socrática ou mesmo com a metafísica de Schopenhauer, por exemplo, a ideia de Ser (a água, o fogo, o logos ou o ar, ou o ápeiron ou a Vontade ....muitos filósofos tentaram qualificar de alguma forma esse Ser-essência da natureza, que nada tem a ver com um deus-criador, mas que, seria apenas , o substrato da natureza ou simplesmente, poderíamos dizer hoje, que o próprio Universo (o que existe; unidade da diversidade) é o infinito que sempre existiu e do qual somos manifestações, partes, sendo a perfeição nada mais do que uma ideia que surge na mente humana que vislumbra possibilidades de mudanças e aperfeiçoamento nas coisas, um modelo do que poderia ser “melhor” baseado no que notamos na natureza onde há coisas mais fortes e outras fracas , feias e belas, mais saborosas, menos saborosas, dor e prazer...

-Lembrando novamente Kant, esse filósofo,também, argumenta que não podemos pensar "deus", pois estaria além dos limites de nossa possibilidade de entendimento racional...Bom, se assim é ( e concordo que temos limites em nossa capacidade racional e perceptiva),se assim é, então: acreditar em deus se reduz a um simples posicionamento moral baseado em uma crença no vazio, pois, deus não se manifesta para nós e não podemos pensá-lo nem percebê-lo (caso contrário, se pudéssemos percebê-lo, seria algo sujeito à análise racional de alguma forma) . Uma crença baseada na ignorância que temos sobre o que não percebemos é , no mínimo, um posicionamento moral muito problemático e desnecessário, que só gera mais problemas que soluções, na verdade, como a história humana atesta muito bem...Mas, e se mesmo assim pudéssemos percebê-lo de alguma forma, porém, não pensá-lo adequadamente, por ser algo tal como a ideia do “infinito”, a crença estaria baseada na simples admiração para com o absurdo de uma ideia nebulosa. Deixo aqui de lado os motivos psicológicos para a crença na divindade, pois, esses nada demonstram sobre a existência ou não de um deus.

Paulo Vinícius


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