terça-feira, 27 de maio de 2014

A decadência do bolchevismo e o retorno do socialismo libertário. (breves constatações)


A decadência do bolchevismo e o retorno do socialismo libertário. (breves constatações)

A "esquerda" (e me refiro aqui aos movimentos e partidos que defendem ou possuem alguma ligação com o que chamamos "socialismo" e que ostentam , pelo menos em seus discursos, a busca pela igualdade e liberdade , bem como a autonomia e emancipação da classe trabalhadora e fim da exploração do trabalho...) vive uma crise de referencias , uma crise de paradigmas , consequência da corrosão das doutrinas bolcheviques (os vários trotskysmos, o stalinismo, as versões do leninismo ...) e o fim das ilusões com relação aos chamados países do "socialismo real" ( que na prática muito pouco tiveram ou têm de socialistas) . Embora, muitos ainda insistam na ostentação de um discurso que já se demonstrou falho e nada positivo para a classe trabalhadora (o discurso das vanguardas bolcheviques), é clara a crise da esquerda na era da globalização do mercado capitalista. A velha esquerda não consegue mais trazer respostas convincentes para animar os trabalhadores para o enfrentamento , não consegue mais mobilizar com eficiência , não tem mais ousadia ou coragem para enfrentar doutrinas anti-socialistas , essa velha esquerda se corrompeu e se enrolou com grupos de direita e aceitou as regras de um jogo onde perdeu sua bandeira.
Mas, apesar da crise da esquerda bolchevique (parte da qual se perdeu em radicalismos dogmáticos e outra parte se dissipou na social democracia...), podemos presenciar uma volta (no sentido de "destaque", recuperar vigor e relevância...) de uma esquerda combativa e que quase foi consumida pelo deslumbramento que as supostas revoluções socialistas causaram na classe trabalhadora no século passado ( as "revoluções" que usaram a ideologia socialista como discurso de persuasão e manipulação da opinião das "massas" para levar vanguardas de partidos ao poder e lançaram populações à tirania estatal) mas, essa esquerda da qual falo não se rendeu, permaneceu como ideal inabalável. Falo do retorno de uma esquerda radical em seus ideais mais caros, de um retorno do anarquismo, um anarquismo reformulado, mas, também do tradicional socialismo libertário; as propostas que esses movimentos trazem não são aplicáveis a grandes territórios, mas, podem e são colocadas em prática em pequena escala , com frequência e podem se espalhar. São propostas de organização do poder popular, assembleias populares, associações de bairro, cooperativas, economia solidária, permacultura, agricultura de subsistência, disseminação de conhecimento no meio virtual, educação libertária, blocos de luta, etc; muitas dessas iniciativas hoje estão mantendo o vigor de uma esquerda que resiste e seduzem até mesmo partidos tradicionais de esquerda que haviam esquecido um pouco desse trabalho na base, porém, a proposta libertária tem algo a mais:
é, além de uma ideologia política e filosófica, uma referência ética para a ação, que pode mudar a forma como encaramos a política e as lutas tradicionais da esquerda , pois, de forma diversa da tradição bolchevique, a preocupação anarquista está voltada para a busca de autonomia somada à solidariedade de classe, mas sem negar a liberdade individual, ou seja, o indivíduo é respeitado como sujeito criador e capaz de pensar de forma independente, sua participação no movimento não é meramente decorativa ou de "soldado" guiado por uma "vanguarda", mas, sim de sujeito ativo que irá somar forças com os demais nesse processo.
-É claro que as propostas libertárias de nada valem se não houver o enfrentamento direto contra as amarras do mercado capitalista . O modo de produção e as ideologias hegemônicas certamente irão resistir a qualquer tentativa de modificação do sistema e assim acontece , como podemos presenciar cotidianamente em nossa sociedade, no entanto, hoje temos acesso a novas tecnologias que podem auxiliar na disseminação de ideias e aproximar pessoas, podemos trabalhar de forma mais eficiente na desconstrução das ideologias (pois, não são apenas o liberalismo e neoliberalismo o problema, doutrinas religiosas e doutrinas políticas mais conservadoras, se somam a essas ideologias e amarram as pessoas, impedindo o afloramento do pensamento crítico e livre...), ideologias essas que impedem a transformação social almejada , atrapalham a ascensão dos trabalhadores e a busca pelo fim da exploração ( ou pelo menos sua minimização...).
-É preciso reconhecer que é provável que as utopias não se realizem (isso é bem provável), mas que algumas são importantes como referências éticas para melhorarmos o que temos agora. O realismo é fundamental, mas não pode ser encarado como base crua para um pragmatismo político do "vale tudo pela governabilidade" ou para fazer valer uma ideologia. Podemos, espalhando conhecimento, mas, fundamentalmente tentando construir conhecimento onde for possível (em especial onde o conhecimento geralmente "não chega oficialmente", nas periferias ), promover algumas mudanças, mas, para tal é necessário rever a forma como encaramos a luta política e buscarmos uma democracia mais plena, dialógica, construída pelos trabalhadores e não por pretensos representantes, oriundos de partidos patrocinados por grandes empresas que , no fim das contas, vão servir ao mercado capitalista e não a quem os escolheu ( o básico que todos nós já estamos cansados de saber...).
-A política institucional não é o único nem , talvez, o melhor caminho, e a esquerda precisa superar velhos discursos bolcheviques dos "iluminados guias da massa" , isso não serve mais e nunca serviu, na verdade.

Paulo Vinícius